DPE reforça lei do acompanhante durante o parto

Medida prevê evitar casos de violência obstétrica

O caso do anestesista investigado pelo estupro de uma mulher logo após ter dado à luz via cesárea, ainda sob efeito de anestesia, num hospital na Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro, nesta semana, escancarou a necessidade de se reforçar um instrumento legal fundamental para a saúde da mulher e também para o seu direito à segurança e ao exercício pleno de seus direitos sexuais e reprodutivos: o direito a um(a) acompanhante na hora de dar à luz, e também antes e no pós-parto. O episódio levantou um debate nacional a respeito da segurança da parturiente. No Paraná, o Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres (NUDEM) da Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR) tem trabalhado continuamente para orientar e assistir mulheres com que tiveram esse direito negado.

De acordo com a assessora jurídica do Núcleo, Camila Mafioletti Daltoé, o NUDEM instaurou, no ano passado, dois procedimentos administrativos durante a emergência sanitária da Covid-19 e passou, por meio deles, a monitorar e a questionar mais de vinte hospitais da capital e do interior para que respeitassem o direito a um ou a uma acompanhante antes, durante e no pós-parto, que está garantido pela Lei 11.108/2015, ou seja, previsto legalmente há 17 anos.

O objetivo foi ter acesso a informações sobre se tal direito estava sendo negado ou dificultado em virtude da pandemia. A servidora explica que, na época, a maioria dos hospitais oficiados relatou que estava, em alguma medida, restringindo o direito ao(à) acompanhante. Nestes casos, o Nudem trabalhou para garantir o direito da parturiente – em alguns casos, após a intervenção do NUDEM, o direito foi respeitado; em outros casos, foi ajuizada ação para garanti-lo.

Atualmente, com o avanço da vacinação e a diminuição de casos graves e óbitos decorrentes do novo coronavírus, os hospitais têm informado que a situação já se encontra normalizada e que o direito ao acompanhante está sendo garantido, com algumas medidas de segurança sanitária sendo adotadas para evitar o contágio.

“Esse direito é uma conquista dos movimentos sociais, das mulheres, porque ficou constatado em pesquisas e pela Organização Mundial da Saúde que a presença do(a) acompanhante durante, na hora do parto e no pós-parto melhoram vários indicadores de saúde e de bem estar da mãe e do recém-nascido”, explica.

Ela lembra que, quando não há a presença de um(a) acompanhante, a mulher relata uma sensação de isolamento e abandono. “É direito da parturiente escolher quem vai melhor acompanhá-la, seja alguém que possa melhor assisti-la, ou fazer sua vontade ser representada na hora do parto”, comenta Daltoé.

Segundo a assessora do NUDEM, durante a pandemia chegaram ao Núcleo muitos relatos de mulheres reclamando do desrespeito de hospitais que, em razão da emergência sanitária, proibiram o(a) acompanhante. “Deveria ter sido pensada uma forma de garantir que a mulher tivesse acompanhante mesmo durante a pandemia”, lamentou.

Isso porque o parto não é uma ocasião banal ou trivial da vida de uma mulher. Dar à luz é uma etapa complexa, com impacto físico e psicológico sobre a mulher. “A importância de se ter um(a) acompanhante está na garantia de exercício de um dos direitos reprodutivos das mulheres, considerando-se que o parto é um processo complexo e marcante na vida delas e, normalmente, existe um preparo, um planejamento [para esse momento]”, afirma.

A presença de alguém de confiança da parturiente é também necessária para que todas as vontades da mulher estejam representadas em um momento em que ela nem sempre tem condições de opinar. “A acompanhante ou o acompanhante do parto vai fazer comq ue as vontades da parturiente sejam representadas na hora do parto, seja na escolha do método de alívio de dor ou na adoção de conduta preferidas em caso de emergência”, lembra, ao mencionar a relevância de alguém estar presente ao lado da mulher para evitar casos de violência obstétrica.

A assessora ressalta que negar a presença de um ou uma acompanhante é considerado violência obstétrica, e garantir esse direito pode ser uma segurança para evitar casos como o do Rio de Janeiro nesta semana. “O(a) acompanhante vai ser alguém que estará observando aquele momento, e também será testemunha ocular [dos fatos] caso aconteça algum tipo de violência obstétrica. Ajuda a tentar evitar a violência, mas também pode ser uma ajuda ao se colocar como testemunha para falar sobre aquilo que aconteceu”, conclui.

O Nudem atua hoje em nove ações de indenização por dano moral e material protocoladas na Justiça na defesa de várias mulheres vítimas de violência obstétrica no Paraná. Os casos estão ainda em fase de instrução, e ocorreram entre 2018 e 2020. Em nenhum deles há relato de violência sexual, mas mulheres que possam ter sido vítimas de violência sexual durante o parto ou de outros tipos de violência obstétrica podem procurar o NUDEM por meio do e-mail [email protected] ou pelo WhatsApp 41 99285-8134. O Núcleo atua essencialmente em demandas coletivas. Em casos individuais, as profissionais do NUDEM encaminham o caso ao setor Cível da Defensoria Pública para atendimento.

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